segunda-feira, 24 de setembro de 2018

ESPÉCIES DE TIBIEZA


A tibieza propriamente dita é a que definimos - o hábito do pecado venial voluntário e a paz com este hábito. Há, entretanto, outras espécies de tibieza.

1. A tibieza de fragilidade e irreflexão. Até os Santos a experimentaram. Só a Virgem Imaculada não a teve. Nosso Senhor permite nos Santos algumas fragilidades e misérias, para conservar neles as virtudes fundamentais da humildade, a desconfiança de si, a compaixão para com as misérias alheias, o desapego da terra e o desejo do céu. Oh! os santos tiveram as suas pequenas fragilidades e misérias. Como se humilhavam! Um dia S. Vicente de Paulo, num ato irrefletido de amor próprio, envergonha-se de um parente pobre! Como se humilhou perante seus irmãos por esta falta! S. Teresinha, no leito de morte, sente-se pobrezinha e imperfeita com uma fragilidade: "Como sou feliz, diz ela, vendo-me tão imperfeita e com tanta necessidade da misericórdia do Bom Deus no momento da morte". Bernadette, o anjo de Lourdes, lamenta as suas imperfeições, a teimosia que a humilhava tanto. S. Catarina Labouré lamenta igual defeito. Guido de Fontgalland expia no leito de dores o que ele chamava as suas preguiças. Poderia multiplicar os exemplos. São as misérias inerentes a esta pobre natureza humana. A perfeição inteira e absoluta não se encontra neste mundo. O Concílio de Viena condenou o erro dos que afirmavam que o homem, nesta vida mesmo, pode adquirir um tal grau de perfeição, que se torna impecável e incapaz de progredir na virtude. Tal foi também o erro dos Iluminados. O Concílio de Trento é mais claro ainda. Condena quem disser que o homem pode, durante esta vida, evitar as mais pequeninas faltas, a não ser por um privilégio especial de Deus. E este privilégio só o teve Maria Santíssima (Sess. 6, can. 23).


A tibieza de fragilidade é inevitável. Não nos perturbemos com ela. Recorra-mos à oração, aos sacramentos e sobretudo à Santa Eucaristia, e nos purificaremos sempre destas fragilidades e misérias. Depois temos a 2. Tibieza da vontade. É mais grave que a de fragilidade. É a vontade enfraquecida. Deus a permite para confusão de nosso orgulho e melhor nos convencer de nossa miséria. Um firme propósito, um gesto de arrependimento sincero, com a resolução de se vigiar com mais cuidado, e tudo está reparado. A tibieza de vontade é facilmente remediável. Finalmente a 3. Tibieza do pecado venial voluntá­rio e habitual e é desta que aqui vimos tratando.


FONTE: BRANDÃO, Monsenhor Ascânio. A tibieza - seus sinais, consequências e remédios. Ed.Vozes, 1948. 2ª ed. pg. 10 - 13.
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Sobre a obra: Ao anunciar a ruína do templo e os últimos dias do mundo, Nosso Senhor predisse: E porque abundou a iniquidade se há de resfriar a caridade de muitos. Quoniam abundavit iniquitas refrigescet caritas multorum. (Mt 24,12). Parecemos chegados a estes dias sombrios. Resfria-se a caridade, o fervor de tantas almas, enquanto a iniquidade cresce assustadoramente. A tibieza é o grande flagelo. É o espinho mais doloroso do Coração de Jesus. Sobretudo a tibieza das almas consagradas a Deus, das almas outrora fiéis à graça. Não se presta bastante atenção à tibieza, esta mediocridade perigosa e funesta na vida espiritual. Dai tanta falsa piedade e esta ausência do verdadeiro espírito evangélico, do sentido cristão na vida de muitos devotos e devotas. O espírito de sacrifício, o senso da responsabilidade, a seriedade, a tremenda seriedade da vida cristã de que fala Bossuet, tudo isto anda ai tão esquecido, tão mal compreendido. Só almas fervorosas poderão salvar este mundo paganizado. Almas de elite. Almas de neve e corações de fogo no dizer do Pe. Mateo. Mas elas são tão raras, tão raras, meu Deus! Que este livrinho seja uma centelha e provoque incêndios e ilumine algumas almas. Eu o consagro ao Divino Coração de Jesus, fornalha ardentíssima de Amor. Cor Jesu, flagrans amore nostri. Inflamma cor nostrum amore fui! Coração de Jesus, todo abrasado de amor por nós, inflamai nosso coração nas chamas de vosso amor!
Junho de 1937.
Monsenhor Ascânio Brandão

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